MEMORIAL DA INCLUSÃO: OS CAMINHOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

O documento não é inócuo. É antes de mais nada o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura... O documento é monumento”. Jacques Le Goff
Esta Exposição reúne aproximadamente seiscentos documentos, selecionados para compor uma leitura do movimento social da pessoa com deficiência, sua luta e conquistas. Tais documentos foram reunidos e sugeridos por uma equipe seleta de militantes do segmento, que disponibilizaram seus acervos pessoais e abriram os canais para o encontro sempre proveitoso com outros acervos e pessoas, também dispostas a contribuir para contar e relembrar os caminhos da pessoa com deficiência para a inclusão social.
A ideia original de contar a história do movimento social da pessoa com deficiência foi ampliada para memorial da inclusão, por considerar que as reivindicações e conquistas deste segmento são benefícios para toda a sociedade, apesar de reivindicações muito pontuais.
A ideia evoluiu para traçar os caminhos das pessoas com deficiência em prol de uma sociedade mais inclusiva e, assim, com esta proposta, estimular a reflexão de que as formas e frentes de ação do segmento contribuíram sobremaneira para conquistas constitucionais e legais e, fundamentalmente, para mudanças nos valores sociais, na percepção da sociedade sobre a pessoa com deficiência. Tais caminhos concederam à sociedade brasileira a oportunidade de compreender e aceitar o diferente e significar a diversidade.
O Memorial da Inclusão faz jus ao que se entende por história e por memória. Não existe nem história e nem memória puras. Elas são o resultado de escolhas, de seleção, voluntária ou involuntária: do historiador, da sociedade e do sujeito.
O documento/monumento, oficial ou pessoal (um manuscrito, uma foto, um objeto, entre outros), o testemunho, o ouvir dizer, as lembranças vívidas ou as vagas lembranças, tudo é material da história.
A memória e a história são dinâmicas, não se encerram em conjuntos específicos de datas, personalidades e documentos. Um documento traz o outro, uma lembrança traz outra, a memória voluntária estimula a memória involuntária. O Memorial da Inclusão pretende respeitar este dinamismo natural, e, assim, a Exposição aqui apresentada é o começo, um começo...
Que muitas lembranças, vívidas e vagas, objetivas e emotivas, munidas ou não de documentos escritos, sejam estimuladas pelos caminhos aqui traçados e aspirem compartilhar com este Memorial da Inclusão outros caminhos e mais saberes!






http://www.memorialdainclusao.sp.gov.br/br/home/entrada.shtml

ENVOLVIMENTO DA FAMILIA NAS PRÁTICAS INCLUSIVAS DA ESCOLA

                                                                                 “Barreira humana é pior do que escada”, diz mãe

Ocorre envolvimento da família nas práticas inclusivas da escola quando:
1 . Existe, entre a escola e a família, um sistema de comunicação (telefonemas, cadernos etc.) com o qual ambas as partes concordam.
2. Os pais participam nas reuniões da equipe escolar para planejar, adaptar o currículo e compartilhar sucessos.
3. As famílias são reconhecidas pela escola como parceiros plenos junto à equipe escolar.
4. As prioridades da família são utilizadas como uma base para o preenchimento do Plano Individualizado de Educação (PIE) do   seu filho, base essa que será completada com partes do conteúdo curricular.
5. Os pais recebem todas as informações relevantes (os direitos dos pais, práticas educativas atuais, planejamento centrado-na-pessoa, notícias da escola etc.).
6. Os pais recebem ou têm acesso a treinamento relevante.
7. Os pais são incluídos no treinamento com a equipe escolar.
8. Os pais recebem informações sobre os serviços de apoio à família.
9. Existem à disposição de membros das família serviços de apoio na própria escola (aconselhamento e grupos de apoio, informações sobre deficiências etc.).
10. Os pais são estimulados a participarem em todos os aspectos operacionais da escola (voluntários para saias de aula, membros do conselho da escola,membros da Associação de Pais e Mestres, treinadores etc.).
11. Existem recursos para as necessidades especiais da família (reuniões após o horário comercial, intérpretes da língua de sinais, materiais traduzidos etc.).
12. A escola respeita a cultura e a etnicidade das famílias e reconhece o impacto desses aspectos sobre as práticas educativas.

Tradução e adaptação de Romeu Kazumi Sassaki, 1998.
 Fonte: The Kansas checklist for identifying characteristics of effective inclusive programs. I a ed. em nov. 93, reimpressão em dez. 94, 13 p. Este instrumental foi escrito por um grupo de técnicos e pais das seguintes cidades do Kansas - Horton, Hiawatha, Eudora, Sublette, Hugoton e Lakin, tendo sido compilado por Terry Rafalowski-Weich, Michelle Luksa e Julie Mohesky-Darby. O texto acima foi adaptado da p. 4.

ATITUDES INCLUSIVAS FUNDAMENTAIS EM EDUCAÇÃO

Tradução de Romeu Kazumi Sassaki, 1998.
Todo educador comprometido com a filosofia da inclusão. ..
1- ... está mais interessado naquilo que o aluno deseja aprender do que em rótulos sobre ele.
2-... respeita o potencial de cada aluno e aceita todos os estudantes igualmente.
3-... adota uma abordagem que propicie ajuda na solução de problemas e dificuldades.
4-... acredita que todos os educandos conseguem desenvolver habilidades básicas.
5-... estimula os educandos a direcionarem seu aprendizado de modo a aumentar sua autoconfiança, a participar mais plenamente na sociedade, a usar mais o seu poder pessoal e a desafiar a sociedade para a mudança.
6-... acredita nos alunos e em sua capacidade de aprender.
7-... deseja primeiro conhecer o aluno e aumentar a sua autoconfiança,
8-... acredita que as metas podem ser estabelecidas e que, para atingí-Ias, pequenos passos podem ser úteis.
9-... defende o princípio de que todas as pessoas devem ser incluídas em escolas comuns da comunidade.
10- ... sabe que ele precisa prover suportes(acessibilidade arquitetônica, atendentes pessoais, profissionais de ajuda, horários flexíveis etc.) a fim de incluir todos os alunos.
11-... está preparado para indicar recursos adequados a cada necessidade dos alunos, tais como: livros, entidades, aparelhos.
12-... sabe que a aprendizagem deve estar baseada nas metas do aluno e que cada aluno será capaz de escolher métodos e materiais para aprender as lições.
13-... sabe que, nos programas de alfabetização, os seguintes métodos são eficientes: redação de experiências com linguagem, histórias e outros textos sobre temas que o aprendiz conhece; alfabetização assistida por computador; material disponível no cotidiano do público; leitura assistida ou pareada usando livros convencionais e livros falados; debate após atividade extra-classe; coleção de histórias de vida dos próprios alunos; uso da lousa para escrever um texto em grupo; colagem com recortes de revistas, entre outros.
14-... fornece informações sobre recursos externos à escola e intermedia a conexão com pessoas e entidades que possam ajudar o aluno na comunidade.
15-... estimula outras pessoas importantes na vida do aluno a se envolverem com o processo educativo.
16-... é flexível nos métodos de avaliação pois sabe que os testes, provas e exames provocam medo e ansiedade nos alunos.
17-... utiliza as experiências de vida do próprio aluno como fator motivador da aprendizagem dele.
18-... indaga primeiro o aluno deficiente se ele quer partilhar dados sobre sua deficiência e só cm caso afirmativo passa essa informação para outras pessoas.
19-... é um bom ouvinte para que os alunos possam falar sobre a realidade da vida que levam.
20-... adota a abordagem centrada-no-aluno e ajuda os estudantes a desenvolverem habilidades para o uso do poder pessoal no processo de mudança da sociedade.

Fonte: The Roeher lnstitute. Speaking of Equality: A Guide to Choosing an Inclusive Literacy Program for People with
lntellectual Disability, Their Families, Fdends and Support Workers. North York, Ontario: The Roeher lnstitute, 1995, 35 p.

LISTA DE CHECAGEM SOBRE AS PRÁTICAS INCLUSIVAS NA SUA ESCOLA

Esta lista poderá ser útil para avaliar o grau de consistência entre as práticas inclusivas da sua escola e os ideais do movimento de inclusão escolar. Para cada item, atribua o sinal + (positivo) quando a sua resposta for SIM para a pergunta principal ou o número O (zero) quando a sua resposta for SIM para a pergunta inserida entre colchetes.
Os itens marcados com o número O poderão ser tomados como ponto de partida para debates em sua escola, envolvendo diretor, professores, coordenadores, alunos e pais. Vista neste contexto, uma escola inclusiva seria caracterizada não tanto por um conjunto de práticas e sim pelo seu compromisso em desenvolver continuamente a capacidade de acolher uma ampla gama de diferenças individuais entre seus alunos.
Providencie várias cópias desta lista a fim de que mais pessoas possam utilizá-la.
1. Partimos verdadeiramente da premissa de que cada aluno pertence à sala de aula que ele freqüentaria se não possuísse deficiência? [Ou agrupamos alunos com deficiência em classes separadas ou escolas especiais?]
2. Individualizamos o programa instrucional para todos os alunos, sejam eles deficientes ou não, e oferecemos os recursos que cada aluno necessita para explorar interesses individuais no ambiente escolar? [Ou temos a tendência de oferecer os mesmos tipos de programa e recursos para a maioria dos alunos que possuem o mesmo rótulo diagnóstico?]
3. Estamos plenamente comprometidos em desenvolver uma comunidade que se preocupe em fomentar o respeito mútuo e o apoio entre a equipe escolar, os pais e os alunos, comunidade essa na qual acreditamos honestamente que os alunos sem deficiência podem beneficiar-se da amizade com colegas deficientes e vice-versa? [Ou as nossas práticas tacitamente toleram que alunos não-deficientes mexam com colegas deficientes ou os isolem como se estes fossem seres estranhos?]
4. Nossos professores comuns e educadores especiais já integraram seus esforços e seus recursos de tal forma que eles possam trabalhar juntos como parte integrante de uma equipe unificada? [Ou estão eles isolados em salas separadas e departamentos separados com supervisares e orçamentos separados?]
5 . A nossa diretoria cria um ambiente de trabalho no qual os professores são apoiados quando oferecem ajuda um para o outro? [Ou os professores têm receio de serem considerados incompetentes se pedirem colaboração no trabalho com os alunos?]
6. Estimulamos a plena participação dos alunos com deficiência na vida da nossa escola, inclusive nas atividades extracurriculares? [Ou eles participam apenas na parte acadêmica de cada dia escolar?]
7. Estamos preparados para modificar os sistemas de apoio para os alunos à medida que suas necessidades mudem ao longo do ano escolar de tal forma que eles possam atingir e experienciar sucessos e sentir que verdadeiramente pertencem à sua escola e à sua saia de aula? [Ou às vezes lhes oferecemos serviços tão limitados que eles ficam fadados ao fracasso?]
8. Consideramos os pais de alunos com deficiência uma parte plena da nossa comunidade escolar de tal forma que eles também possam experienciar o senso de pertencer? [Ou os deixamos com uma Associação de Pais e Mestres separada e lhes enviamos um jornalzinho separado?]
9. Damos aos alunos com deficiência o currículo escolar pleno na medida de suas capacidades e modificamos esse currículo na medida do necessário para que eles possam partilhar elementos destas experiências com seus colegas sem deficiência? [Ou temos um currículo separado para alunos deficientes?]
10. Temos incluído, com apoios, os alunos deficientes no maior número possível de provas e outros procedimentos de avaliação a que se submetem seus colegas não-deficientes? [Ou nós os excluímos destas oportunidades sob o argumento de que eles não podem beneficiar-se delas?]
Fonte: Joy Rogers, Research Bulletin (maio 1993), Center for Evaluation, Development, and Research, Phi Delta Kappa, Bloomington, Indiana. Esta lista foi anexada a um memorando, Basic Education Circulars Ganeiro 1995), "Colocação de Alunos de Educação Especial - Política de Inclusão", escrito por Joseph F. Bard, Diretor da Educação de I' e 2' Graus, Secretaria Estadual de Educação, Pensilvânia, EUA.

Componentes da Educação Inclusiva
Tradução e adaptação de Romeu Kazumi Sassaki, 1998.
Fonte: The Roeher lnstitute, Disability, Community and Society: Exploring the Links. North York: Roeher, 1996 p.68-69.

Cresce a inclusão escolar de deficientes

 
Jabes, 10, tem deficiência física e mental. Bruna, 14, paralisia cerebral. Juliana e Rafael, 8, são paraplégicos. Vinícius, 13, cego. Além de serem crianças com necessidades especiais, elas também têm em comum o fato de freqüentarem escolas regulares e estarem na mesma classe de alunos não-deficientes.
A inclusão de crianças deficientes em escolas regulares vem crescendo no país. O número de matriculados cresceu 229% nos últimos cinco anos, segundo o Censo Escolar do Ministério da Educação. Passou de 43.923 alunos em 1998, quando o censo analisou pela primeira vez a situação dos alunos especiais, para 144.583 estudantes no ano passado.
No país, há 503.570 alunos matriculados com necessidades especiais --deficiências visual, auditiva, física e mental. Do total, cerca de 30% freqüentam escolas que oferecem o ensino regular --em 98, eram 13%. O restante está em escolas ou salas especiais.
A recomendação para que pessoas com deficiências sejam educadas na rede regular de ensino está na LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). O Brasil é também signatário de uma declaração internacional que selou o compromisso de garantir acesso à educação inclusiva até 2010.
Se por um lado o acesso às escolas cresce a cada ano, por outro ainda são precárias as instalações físicas, a oferta de material didático-pedagógico e a capacitação de professores para o atendimento dessas crianças.
"Soubemos de um caso de uma criança com síndrome de Down que fica perambulando durante o período de aula pelos corredores da escola. Quem acaba tomando conta dela é a copeira", afirma Edigilson Tavares, coordenador do Instituto Apae, que oferece cursos de capacitação a professores do ensino regular.
Na opinião de José Rafael Miranda, coordenador-geral de desenvolvimento da Secretaria de Educação Especial do MEC, o problema não é falta de recursos. Há verbas federais e de organismos internacionais para projetos que promovam a inclusão da criança deficiente nas escolas, afirma Miranda.
"O país é riquíssimo em leis que protegem as crianças com necessidades especiais. Mas falta sensibilidade para alguns gestores da educação. Ainda há medo e preconceito", diz.
Outro problema é a falta de apoio terapêutico. Muitas das crianças que freqüentam as escolas regulares não conseguem fazer as terapias necessárias (fisioterapia, fonoaudiologia, psicologia, psiquiatria, entre outras) por falta de acesso a locais especializados.
Em Itaquera (zona leste), por exemplo, a fila de espera para ser atendido por uma psicóloga da rede pública de saúde é de 2.000 pessoas. A rede também não dispõe de psiquiatra na região.
"Quando conseguimos vaga em entidades conveniadas, há o problema do transporte. Muitos pais desistem do tratamento porque não têm como arcar com essa despesa", afirma Maria Elisa Frizzarini, supervisora da coordenadoria de educação da Subprefeitura de Itaquera.
É o caso da menina Bruna Lima do Nascimento. Portadora de paralisia cerebral adquirida por problemas no parto, ela não anda, quase não fala e apresenta movimentos bruscos involuntários. Estuda com outros 30 alunos em uma sala da 2ª série do ensino fundamental na escola municipal Benedito Calixto, no Jardim São Pedro (zona leste).
A mãe de Bruna, Maria Lopes de Lima, 45, diz que a filha deveria estar sob cuidados de uma terapeuta ocupacional, mas não há dinheiro para bancar o tratamento. A única renda da casa é a pensão de R$ 240 que a menina recebe em razão da sua deficiência.
Ainda assim, ela acredita que a menina progrediu desde que passou a freqüentar uma escola regular. "Ela já consegue pronunciar algumas palavras, aponta a sala de aula e reconhece os colegas."
Entre os educadores, há os que defendem a inclusão imediata das crianças em classes regulares e outros que preferem a inclusão gradativa, na qual as crianças freqüentam primeiro uma sala especial na própria escola, interagindo com os outros alunos em atividades específicas, para depois entrarem em uma classe regular.
Para Miranda, do MEC, as crianças com deficiências mentais, físicas, visuais e auditivas conseguem inúmeros progressos em classes de ensino regular convivendo com o diferente.
"A linguagem é acelerada e eles aprendem novos conceitos brincando com as outras crianças", diz Sônia Silva, coordenadora de estudos e novas pedagogias da Secretaria Estadual da Educação.
 
CLÁUDIA COLLUCCIda Folha de S.Paulo

Índios estudam em escolas improvisadas e sem formação diferenciada

A Constituição de 1988 garantiu aos povos indígenas uma educação escolar diferenciada, que respeitasse a cultura e os saberes tradicionais de cada etnia. Mas 20 anos depois, escolas sem infra-estrutura, materiais didáticos inadequados e a falta de professores especializados ainda são problemas comuns nas escolas indígenas.

Em setembro, cerca de 600 representantes dessas comunidades e dos governos federal, estaduais e municipais se reunirão em Brasília para a 1ª Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena. A idéia é discutir qual é o modelo de educação adequado para esses povos.

“A educação diferenciada significa que eles têm o direito de utilizar a língua materna nas escolas e introduzir no ambiente escolar seus conhecimentos, práticas e saberes. Em termos de legislação, no plano da educação indígena,o Brasil é bastante avançado, o que precisa é sair do plano ideal e ser de fato implementada”, avalia o secretário-executivo do Instituto de Pesquisa e Formação em Educação Indígena (Iepé), Luis Donisete Grupioni.
ResistênciaPara o especialista, as secretarias de educação ainda têm “enorme resistência” em aceitar calendários diferenciados propostos pelas comunidades. “A legislação garante que se uma comunidade realiza um grande ritual ou há épocas em que boa parte dos seus membros saem para caçar, a escola teria que se adaptar às atividades cotidianas desses grupos”, explica.

Susana Grillo, da coordenação de educação indígena do Ministério da Educação, afirma que é preciso garantir a autonomia pedagógica das escolas indígenas. “Envolve a questão da proposta curricular, da organização da escola, da formação do professor e efetivar esse protagonismo das lideranças, pais e mães a formular esse projeto político ainda é um desafio. Porque a tradição da nossa educação é de propor padrões muito homogeneizantes, sem considerar as diversidades ”, defende.

Desde dezembro passado o MEC está realizando conferências regionais que vão orientar o debate nacional em setembro. Cinco encontros já foram realizados e mais 13 estão programados até agosto. Para Grupioni, um dos maiores desafios é conseguir formar membros das comunidades para que eles possam assumir as salas de aula e a gestão das escolas indígenas. A prático do ensino bilíngue, ou seja, no português e na língua de cada etnia, ainda não é uma prática nesses espaços.

“Para isso seriam necessários materiais didáticos para que essa língua apareça e possa ser estudada. Essa produção ainda é muito deficiente. Existe em pequenas quantidades e não atinge o conjunto dos grupos”, aponta.
Improviso nas escolaA infra-estrutura das escolas também é um fator que dificulta a aprendizagem. Segundo o especialista, muitas escolas funcionam de forma improvisada na casa de professores, sem bibliotecas ou equipamentos.

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases, a educação indígena deve ser orientada pelo Mnistério da Educação e orientada pelas secretarias estaduais e municipais. Para Grupioni, a descontinuidade das políticas que mudam a cada governo dificultam a consolidação do processo. “A cada troca do governo você começa os programas novamente, a rotatividade dos técnicos é muito grande. No Brasil a gente não tem uma cultura de acumular experiência de uma gestão para outra”, diz.

O investimento na formação dos técnicos que serão responsáveis pela aplicação das políticas públicas é fator-chave na opinião de Susana. “Você tem que qualificar os gestores permanentemente para a questão da diversidade no campo da educação”, afirma.

Ela espera que a conferência possa servir como local para apontar os problemas e levantar as soluções. Segundo ela, cerca de 450 lideranças indígenas virão a Brasília para o encontro, além de representantes de instituições responsáveis por executar as políticas públicas.

“Os problemas não são novos e são reincidentes. O desafio da conferência será trazer essas demandas a público e encaminhar soluções. O interessante é que elas estão sendo levantadas lá na base com as pré-conferências. Após a conferência, as demandas levantas devem seguir de base para que os governos formulem as políticas públicas de educação indígena”, defende Grupioni.

Referencial curricular nacional para escola indígenas

por Luís Donisete Benzi Grupioni
Consolidando este quadro, um novo documento começou a chegar nas escolas indígenas de todo o país: o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas (RCNEI), documento indutor e orientador de novas práticas, que contou com a participação de especialistas, técnicos e professores índios em sua formulação. Trata-se de um longo e detalhado documento em que se apresentam considerações gerais sobre a educação escolar indígena, quer através da fundamentação histórica, jurídica, antropológica e pedagógica que sustenta a proposta de uma escola indígena que seja intercultural, bilíngüe e diferenciada, quer através de sugestões de trabalho, por áreas do conhecimento, que permitam a construção de um currículo específico e próximo da realidade vivida por cada comunidade indígena, na perspectiva da integração de seus etno-conhecimentos com conhecimentos universais selecionados. Num campo que se caracteriza por uma plêiade de concepções e práticas diferentes, o documento conhecido pela sigla RCNEI conseguiu reunir e sistematizar um mínimo de consenso, capaz de subsidiar diversas interpretações e propostas de construções pedagógicas e curriculares autônomas. Para que isto de fato ocorra será preciso qualificação profissional dos agentes educacionais e abertura nos rígidos esquemas administrativos das secretarias de educação, de modo que se possa construir novos canais de interlocução em que as comunidades indígenas tenham papel ativo na definição do projeto político pedagógico de suas escolas.

 A Educação Escolar Indígena e o Plano nacional de Educação

 Em 09 de janeiro de 2001 foi promulgado o Plano Nacional de Educação, também conhecido pela sigla PNE. Ele apresenta um capítulo sobre a educação escolar indígena, dividido em três partes. Na primeira parte faz-se um rápido diagnóstico de como tem ocorrido a oferta da educação escolar aos povos indígenas. Na segunda parte, apresentam-se as diretrizes para a educação escolar indígena. E na terceira parte, estão os objetivos e metas que deverão ser atingidos, a curto e a longo prazo.
Entre os objetivos e metas previstos no Plano Nacional de Educação destaca-se a universalização da oferta de programas educacionais aos povos indígenas para todas as séries do ensino fundamental, assegurando autonomia para as escolas indígenas, tanto no que se refere ao projeto pedagógico quanto ao uso dos recursos financeiros, e garantindo a participação das comunidades indígenas nas decisões relativas ao funcionamento dessas escolas. Para que isso se realize, o Plano estabelece a necessidade de criação da categoria escola indígena para assegurar a especificidade do modelo de educação intercultural e bilíngüe e sua regularização junto aos sistemas de ensino.
O Plano Nacional de Educação prevê, ainda, a criação de programas específicos para atender às escolas indígenas, bem como a criação de linhas de financiamento para a implementação dos programas de educação em áreas indígenas. Estabelece-se que a União em colaboração com os Estados devem equipar as escolas indígenas com equipamento didático-pedagógico básico, incluindo bibliotecas, videotecas e outros materiais de apoio, bem como serão adaptados os programas já existentes hoje no Ministério da Educação em termos de auxílio ao desenvolvimento da educação.
Atribuindo aos sistemas estaduais de ensino a responsabilidade legal pela educação indígena, o PNE assume como uma das metas a ser atingida nessa esfera de atuação a profissionalização e o reconhecimento público do magistério indígena, com a criação da categoria de professores indígenas como carreira específica do magistério e com a implementação de programas contínuos de formação sistemática do professorado indígena.

Estudo da FE mostra que livro didático não prima pela diversidade sexual

  

             "O papel de problematizador e orientador do debate, que cabe ao educador, é essencial para que os adolescentes aprendam a refletir e tomar decisões coerentes com seus valores, no que diz respeito à sua própria sexualidade, ao outro e ao coletivo, conscientes de sua inserção em uma sociedade que incorpora a diversidade."¹

Inserção da Cultura Afrodescendente no Currículo Escolar

Abordagens e Perspectivas de um Processo Duradouro



Ao longo da História do Brasil, discriminação, racismo e preconceito sempre fizeram parte do cotidiano da vida da população afrodescendente, refletindo-se ainda mais na vida de mulheres, homens e crianças prodigiosamente desprestigiados social e economicamente, situação que, considerando mais de 500 anos de existência, pouco se alterou. Em 1854 o decreto nº 1.331 legitimou a não admissão de escravos nas escolas públicas, mais adiante, em 1878 o decreto nº 7.031-A determinou que os negros só poderiam estudar a noite e ainda assim, vários mecanismos foram desenvolvidos afim de, dificultar tal oportunidade de educação, se é que podemos chamar de oportunidade. Estabelecia-se, desde então, um divisor étnico-racial que se enraizou nos sistemas escolares e daí se dissipou para toda a sociedade brasileira. Muitos anos depois busca-se alterar este quadro, a partir do mesmo veículo- a Educação, mas, infelizmente, pode-se afirmar que o processo de desqualificação de um sistema tão arraigado de preconceitos e armado sobre os dormentes da segregação será uma luta difícil, longa e dolorosa.
Desde sempre a desqualificação de um em favor da afirmação de outro esteve presente nas relações étnico-raciais. A propósito, Borges (2002) afirma que ainda na Antiguidade Heródoto (século V a.C.) escrevia textos sobre os não-gregos, chamando-os de bárbaros, baseando essa denominação na superioridades gregos e na inferioridade dos estrangeiros, determinando a superioridade de sua cultura como justificativa das relações de dominação política, militar, econômica e cultural a qual foram submetidos os povos estrangeiros conquistados pela Grécia. Já na Europa do século XV, a dominação de africanos foi justificada pela culpa do pecado original dos descendentes de Cam. Não por acaso, Borges (2002) ainda coloca que, pelo ideologismo português das raças infectas (índios, negros, judeus e mouros), a história da colonização brasileira é marcada pela diferença entre homens, moldada desde o início por concepções racistas de superioridade e inferioridade.
A discussão sobre a invenção e a intenção de raça foi abordada por Kenski (2003), fazendo citação ao botânico sueco Carolus Linnaeus que criou a humanidade Homo sapiens e a dividiu em quatro grupos: os vermelhos americanos, geniosos, despreocupados e livres; os amarelos asiáticos, severos e ambiciosos; os negros africanos, ardilosos e irrefletidos e os brancos europeus, evidentemente, ativos, inteligentes e engenhosos, este procedimento, possivelmente, abril as discussões sobre a existência de raças humanas e o valor de cada uma delas, utilizando o termo RAÇA com suposta legitimidade científica, fator que, no mundo moderno, foi alterado pelo significado social do termo, posto de sua inexistência científica. Ainda assim, a teoria cientificista de Linnaeus encontrou muitos adeptos séculos afora, um deles foi o conde francês Joseph Arthur de Gobineau, que quase 100 anos depois de Linnaeus, coloca Kenski (2003), concluiu que a miscigenação causa a decadência dos povos e que os alemães eram uma raça superior às outras, contrariando amplamente o juízosocial e antropológico criado por cientistas sérios de que a miscigenação conduz a sociedade a ummaior potencial de desenvolvimento em virtude da associação cultural e genética.
A realidade brasileira de crença e absorção da divisão da sociedade em raças é um fato consumado que contrariao discurso nacional da democracia racial, isto porque, os brasileiros não só acreditam nas raças como também agem em consonância com elas, fundamentando preconceito, discriminação e segregação, ao passo que "o resultado da crença de que não temos racismo foi, de acordo com muitos cientistas, um dos piores tipos de racismo que se conhece. A forma mais eficiente de reforçar o preconceito é achar que ele não existe, que é natural" (KENSKI, 2003 p.49).
Para Borges (2002), o fato é que a sociedade brasileira encontra-se marcada pela exclusão social e pela discriminação racial. Essa situação reflete a existência de um racismo efetivo, com repercussões negativas na vida cotidiana da população negra, principalmente quando cidadania é o tema em questão.
De acordo com o Relatório do Conselho Nacional de Educação quando da aprovação das Diretrizes para a Educação das Relações Étnico-Raciais (2004), sem a intervenção do Estado, os postos à margem, entre eles os afro-brasileiros, dificilmente poderão romper o sistema que agrava desigualdades e gera injustiça, ao reger-se por critérios de exclusão, fundados em preconceitos e manutenção de prestígio e privilégios para uns em detrimento do desprestígio de muitos.
Chiavenato (1999), acerca da culturalização da teoria de inferioridade de indivíduos negros, faz citação à publicação no Caderno de Folclore, nº 7 do Ministério da Educação e Cultura (MEC) em que publicou-se: " a entrada do negro no Brasil foi simultânea com a descoberta do país. Ele conhecia a escravidão, cultiva-a, e praticava-a como um sistema político. A escravidão era praticada na própria África. Os próprios africanos transplantaram-na para a América". Neste discurso, a responsabilidade pela escravidão é transferida para os negros, livrando nossas elites de qualquer responsabilidade ou prática racista e preconceituosa contra os povos que denominavam de mouros. Aqui já se evidencia que para que o processo educacional alcance os objetivos das Diretrizes Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais, é fundamental que o sistema de ensinotenha discernimento, quanto à importância de se coibir a dissipação de teorias que deturpam a realidade e negam aos afrodescendentesqualquer direito de reivindicação por reparações, sendo, importantíssima a construção de uma identidade nacional pautada na coexistência de diferentes culturas que propiciem o Relacionamento Étnico-Racial e Intercultural sem desníveis ou lacunas que ultrapassem o campo ideológico.
Em razão da Educação para as Relações Étnico-Raciais, Inocêncio da Silva (2001) celebra a diferença afirmando que o reconhecimento da importância de uma educação pluricultural, pluriracial e não-eurocênctrica constitui-se em um dos pilares de uma sociedade brasileira verdadeiramente democrática.
De acordo com Trevisan (1988) toda sociedade que está marcada por desigualdades muito visíveis, mantidas por certa violência, precisa sempre escolher alguém- individualizado ou em grupo- como inimigo, a quem se deve ofender quando possível, a quem deve temer quando inferiorizado, e a quem se deve humilhar sempre, principalmente utilizando a marca do plural. É, justamente, em contraposição a esse comportamento ideológico-social que, a partir das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais (2004), se entende que para promover a reeducação das relações étnico-raciais, no Brasil, é necessário fazer emergir as dores e medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o preço da marginalização e da desigualdade imposta a outros e, então, decidir que sociedade queremos construir. Assim sendo, ainda pelas Diretrizes (2004) a educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens entre brancos e negros, trocas de conhecimentos, quebra de desconfianças, projeto conjunto para construção de uma sociedade justa, igual e equânime.
Pedagogias de combate ao racismo e a discriminações devem ser elaboradas com o objetivo de fortalecer entre os negros e despertar entre os brancos a consciência negra. Para Borges (2002) a própria noção de identidade de uma cultura se dá por meio da consciência de suas diferenças em relação às outras culturas, sem que, para tanto, se criem juízos de valor que desqualifique uma em detrimento de outra .
As afirmações de Oliveira (2003) confirmam que tem sido difícil introduzir o tema afro na esfera das políticas públicas e jurídicas. Foi necessário que se abrissem espaços de discussão contra impérios conceituais que apagam nossas realidades com as concepções de que todos somos mestiços e, portanto, somos iguais, concluindo assim que vivemos em uma democracia racial, nada mais conveniente quando se pretende manter um padrão de hierarquização social e racial orientado na acentuação da pejoratividade das diferenças. Para alterar os paradigmas construídos por tais impérios conceituais, Oliveira (2003) defende a idéia de que precisamos garantir a vez e a voz dos marginalizados da cultura dominante, aprendendo a compreender a diferença e a diversidade como fator de acréscimo e não de exclusão. Portanto, se a escola se pretende democrática, não deve homogeneizar saberes e crenças, muito menos impor um padrão cultural sem tentar perceber nuances culturais e étnicos de todos os participantes do processo educacional.

Referencias
·BORGES, Edson, et al..Racismo, preconceito e intolerância.. São Paulo: Atual, 2002;
·CHAIB, Lídia. Ogum, o rei de muitas faces e outras histórias dos orixás.São Paulo: Cia das Letras, 2000;
·CHIAVENATO, José Júlio. O negro no Brasil: da senzala à abolição. São Paulo: Moderna, 1999;
·DEL PRIORE, Mary e VENÂNCIO, Renato Pinto (org.). Ancestrais: uma introdução à História da África Atlântica;
·GENOVESE, Eugene Dominick. Da Rebelião à Revolução: as revoltas de escravos negros nas Américas.São Paulo: Global, 1983;
·INOCÊNCIO da SILVA, Nelson Fernando. Consciência negra em cartaz. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001;
·KENSKI, Rafael. Vencendo na Raça. In: Revista Superinteressante, edição 187, p. 42-50. São Paulo: Abril, 2003;
·MARQUES, Adhemar, et al.. História do Tempo Presente. São Paulo: Contexto, 2003;
·MEC/SEPPIR. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Racias e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília: Seppir/MEC, 2004;
·MJ/SEDH/DPDH. Discriminação- crimes por raça e cor. Brasília: MJ, 2001;
·NEVES, MARIA DE Fátima Rodrigues das (org.). documentos sobre a escravidão no Brasil. São Paulo: Contexto, 2006;
·OLIVEIRA,Iolanda (org.). Relações raciais e educação: novos desafios. Rio de Janeiro: DP&A, 2003;
·SENADO FEDERAL(Sebastião Rocha). Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: SEEP,2000;
·TREVISAN, Leonardo. Abolição: um suave jogo político. São Paulo: Moderna, 1988.
Relações Étnico-Raciais No Brasil publicado 14/10/2008 por Glauciela